Uxbal vive em Barcelona e sobrevive do trabalho instável de agenciador de imigrantes ilegais. Ele faz o melhor que pode para cuidar dos dois filhos pequenos, diante da mãe ausente e irresponsável. Dois novos grandes dramas o aguardam em breve.
19/01/2011
Em seu primeiro trabalho depois da separação de Guillermo Arriaga, seu roteirista em trabalhos como
Babel,
21 gramas e
Amores brutos, o premiado cineasta mexicano Alejandro González Iñárritu (
leia entrevista concedida ao Cineweb) recorreu a outros dois parceiros na escrita desta história – Armando Bo e Nicolás Giacobone. O resultado é uma trama densa, que dispensa a narrativa em espiral que caracterizou o trabalho com Arriaga, e que vincula a instabilidade social e emocional de uma família com a desordem contemporânea – com direito a comentários pertinentes sobre imigração ilegal, exploração do trabalho clandestino e pirataria.
O eixo é Uxbal (Javier Bardem), pai que tem a custódia de dois filhos pequenos, lidando com o desequilíbrio emocional da ex-mulher, Marambra (a argentina Maricel Alvarez). Tanto quanto a vida pessoal, a vida profissional de Uxbal é um tumulto incessante – ele trabalha como intermediário em negócios envolvendo o trabalho ilegal de chineses e africanos. Mas ele mesmo, europeu, não tem uma qualidade de vida muito melhor do que a deles.
Longe de constituírem apenas um aspecto marginal, as situações dos chineses e africanos se fortalecem na história na medida em que, nos dois grupos, há personagens de verdade, não tipos unilaterais. Com isso e o reforço a um lado ético na personalidade de Uxbal, apesar de tudo, o painel humano do drama ganha uma autenticidade impressionante, que sinaliza a todo momento para a eterna possibilidade da descoberta de algum tipo de fraternidade entre as pessoas.
Onipresente nas histórias de Iñárritu, a morte permeia toda a narrativa – pendente sobre Uxbal, que se descobre doente, o que o angustia pela dependência dos filhos; sobre o trabalho cotidiano dos imigrantes ilegais, inseguro como seus alojamentos. Existe mesmo um aspecto sobrenatural de Uxbal, que supostamente é capaz de falar com os mortos e por isso é chamado por muitas pessoas. Essa particularidade, longe de proporcionar-lhe qualquer alívio espiritual, é mais um tormento para o homem, especialmente quando se envolve num sério incidente com seus imigrantes.
Iñárritu é o tipo do diretor que não comporta meios-termos – em geral, críticos e espectadores amam-no ou odeiam-no. Mesmo este último grupo, porém, vai ter dificuldade em negar a qualidade da magistral atuação de Javier Bardem, que se transfigura na pele de um homem contemporâneo e cheio de conflitos, que lhe valeu o prêmio de melhor ator no Festival de Cannes 2010 (injustamente dividido com o italiano Elio Germano, pelo melodramão La nostra vita).
Neusa Barbosa