“No filme tento observar dois mundos. Aquele refinado da escritora parisiense e o dos jovens sem perspectivas de futuro. Coloco-os frente a frente, e são dois mundos que não conseguem se comunicar. É preciso o enfrentamento. Acredito que a forma eficaz de se conviver atualmente é pela comunicação e o enfrentamento pacífico”, disse em entrevista ao Cineweb, em São Paulo.
Cantet, para quem o cinema com tom social não é novidade, acredita que esse seja seu filme mais feliz. “Os personagens tentam se encontrar, compreender seu lugar no mundo, compreender ao próximo. Não é fácil, mas tento trazer uma nota de esperança em meio ao caos do presente”.
Para ele, se não houver um trabalho de reflexão, proposto por exemplo pelo cinema, a vida no Ocidente estará fadada ao fracasso. A Trama se une ao time de filmes da Mostra que lidam com temas sociais correntes na Europa, como a questão dos refugiados e a ascensão da extrema direita – como Lutando através da noite e Essa é a nossa terra. “A dificuldade de vivermos juntos é uma questão importante no presente. É preciso aceitar o modo de vida do outro.”
Cantet trabalha nesse filme há algumas décadas, mas, apenas três anos atrás, começou a escrever o roteiro. Ele conta que faz um texto com diálogos muito precisos e detalhados, mas durante os ensaios dá oportunidade para que o elenco os transforme. “É preciso que interpretem da maneira deles, que encontrem suas próprias palavras, suas próprias energias, e assim se crie a interação.” No filme, o diretor trabalha com elenco experiente, como Marina Föis, e jovens iniciantes – destacando-se Matthieu Lucci, que interpreta um rapaz especialmente problemático. “No set trato todos da mesma forma, faço as mesmas exigências, até para que haja uma unidade nas interpretações”.
A seleção do elenco foi um processo longo e envolveu três cidades diferentes. “Era necessário encontrar jovens não apenas talentosos, mas que também fossem capazes de manter uma interação uns com os outro. Se tivesse algum erro ali, o filme não existiria.” Com eles, foi capaz de ampliar o olhar sobre a juventude contemporânea, quando busca compreender questões como a sedução dos mais jovens pelos extremos e a falta de referência que eles têm para se encontrar no mundo.
O filme estreou na França há três semanas, onde recebeu críticas bem positivas e levantou diversos debates. “Fiz questão de participar de várias sessões, e em todas surgiram questões pertinentes sobre o estado do mundo.”